Flip 2024: Felipe Neto e Patrícia Campos Mello focam na atuação da imprensa e popularização da leitura
PublishNews, Talita Facchini, 11/10/2024
O ambiente midiático, a ação das Big techs e o papel da imprensa deram o norte do bate-papo que ainda ajudou a divulgar a Lei Cortez para o grande público

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“O que posso pedir é venham para a Flip, me façam perguntas, me tirem da zona de conforto e me escutem com a mente aberta” – repetiu o influenciador e empresário Felipe Neto nas últimas semanas. Desde que foi anunciado na programação principal da Flip, o autor de Como enfrentar o ódio (Companhia das Letras) lidou com comentários questionando a decisão da Festa Literária.

No início da tarde desta sexta (11), no que dividiu com a jornalista e autora Patrícia Campos Mello – e que contou com mediação da também jornalista Fabiana Moraes – temas como a importância e relevância da imprensa, regras sobre o ambiente digital, o poder das big techs, os meandros do algoritmo, a Lei Cortez e o poder da leitura fizeram parte da discussão.

O papel da imprensa

O tema do jornalismo, a imprensa, sua importância e relevância, ocuparam grande parte da conversa. Fabiana iniciou o bate-papo dando o exemplo da cobertura da imprensa nas últimas eleições municipais, principalmente em São Paulo, e em como a imprensa reportou com isso. “A gente não sabe lidar com esse tipo de liderança política que por sua vez consegue manipular o ciclo de notícias e pauta o que a imprensa vai reverberar. Não cobrir não é a solução, a questão é sobre como cobrir”, disse Campo Mello. “O papel da imprensa é cobrir de forma crítica e contextualizada”.

“Minha análise é um pouco mais externa. É a análise de quem consome o jornalismo e na minha visão nós temos um problema sistêmico no Brasil que é o controle midiático concentrado na elite econômica”, disse Felipe. Segundo o influenciador e empresário, enquanto tivermos o controle de mídia centrado em pequenos grupos familiares, o sistema jornalístico vai sempre atender aos interesses financeiros e não o interesse social. “Não acho que o jornalista é o grande culpado, quem está na linha de frente. É o sistema”.

“Os grandes jornais sempre vão defender interesses muito mais voltados para a direita do que para um potencial centro, uma potencial esquerda, e isso pra mim é a grande derrota que a gente tem no momento atual do jornalismo brasileiro”, afirmou Felipe.

Em outro momento da conversa, a imprensa voltou a ser o tema, com Patrícia defendendo o papel do repórter. “Nesse meio tem uma pessoinha, um funcionário padrão, que está investigando e descobrindo as coisas e é daí que vem a informação factual. Tem uma pessoa cujo emprego é literalmente descobrir o que está acontecendo e muitas vezes a gente esquece”, lembrou.

“Eu acho que sim, tivemos um enfraquecimento da imprensa. Mas quem pauta se a informação chega para duas pessoas ou duas milhões, é se ela dá clique, se ela engaja”, provocou Patrícia, que está escrevendo um novo livro sobre a privatização do debate público pelas bigh techs. “A consequência disso é a viralização do clickbeit”, completou Felipe.

A jornalista também comentou sobre o tema da inteligência artificial e como o compilado de informações que ela reúne para as pessoas, desvaloriza e dificulta a remuneração de sites de informação e, consequentemente, do jornalista. “Assinem veículos de imprensa. O jornalista precisa ser pago”, pediu.

A influência das big techs

Por que se evita tanto por aí a crítica às big techs? – questionou Moraes. “A ideia de que você não pode responsabilizar as big techs por nada, não funciona. Isso é um incentivo perverso para elas não façam nada em relação aos discursos de ódio, a incitação a golpes, etc, etc. Mas se formos pensar, no Brasil, desde 2020, todas as tentativas de regulação, todas as tentativas de se ter uma Lei sobre o tema foram barradas”, contextualizou Patrícia.

A jornalista lembrou ainda que qualquer tentativa de regulação é divulgada pela extrema-direita como sendo contra a liberdade de expressão. “Quem determina o que chega até você é a big tech. Elas precisam ter responsabilidade, senão vamos ver, de novo, na próxima eleição, mais tentativas de golpe sem ninguém se responsabilizar por isso”, lembrou.

“As redes sociais são desenvolvidas tendo como mote principal o lucro, e não a ética social. Enquanto essa inversão não acontecer nada vai mudar. E como enfrentamos o poder do lucro? Lei”, completou Felipe. “A gente precisa ditar para as plataformas o seguinte: a prioridade é a ética, o bom senso”.

Lei Cortez

Falando sobre a criação de Leis, a questão da Lei Cortez surgiu da plateia para Felipe. “Ao incentivar a compra na Amazon, você não acha que pode contribuir para o sufocamento da cadeia produtiva do livro?”, questionaram.

A provocação foi o mote para Felipe explicar para o grande público o que seria a Lei Cortez e repetir o que vem dizendo em suas últimas entrevistas: que é a favor da lei e um grande apoiador das livrarias físicas.

“Tem uma questão que pode ser aprovada e que mudaria bastante o ecossistema, mas que os deputados estão sentados em cima há uma década, que é a Lei Cortez”. Ao explicar sobre o projeto de lei, Felipe reiterou: “a aprovação da lei Cortez é um dos os principais necessários para a gente começar a ter o enfrentamento à dominância digital da Amazon”.

“Para poder melhorar o ecossistema, a gente precisa que a Amazon seja impossibilitada de oferecer descontos muito agressivos em lançamentos, porque voce quebra a cadeia literária, quebra a livraria. Quem na população vai apoiar isso?”, questionou antes de explicar os detalhes da lei.

A popularização da leitura

“A importância do livro nunca pode ser subestimada”, disse Felipe ao trazer dados de leitura no Brasil vistos na pesquisa Retratos da Leitura e compartilhar que mais de 80% do seu público no Clube de Leitura FN é feminino e na faixa dos 30 anos.

O influenciador abordou a desimportância dada à literatura de ficção e reforçou mais de uma vez que a “literatura é o que forma uma sociedade de resistência”. “Sem a literatura, todo mundo fica suscetível a discursos de grandes líderes carismáticos de extrema-direita neofascistas”, disse.

Pegando esse gancho, ele voltou a falar sobre um tema que discute nas redes sociais há anos: a obrigação da leitura dos clássicos nas escolas e como isso pode afastar novos leitores. “Se a gente não fizer a introdução à literatura sem a visão de que ela tem que ser ‘institucional’, ‘arrogante’, e sem entender que a criança precisa ser introduzida ao mundo da literatura para despertar paixão e não hábito, também não vamos conseguir reverter isso [os baixos índices de leitura no país]”.

"A leitura não é habito, a leitura é prazer, é paixão", finalizou.

[11/10/2024 14:40:00]